sábado, 2 de fevereiro de 2008

ACEDER AO TEXTO

ACEDER AO TEXTO


Perante um qualquer texto, seja ele de natureza poética, pictórica ou melódica, pode o leitor-observador ter atitudes muito diferentes e todas elas de reconhecido mérito, sempre exigentes, mas de complexidade variável.
Olhar um texto, entrar dentro dum texto, compreender um texto, fruir um texto pode fazer-se por portas e janelas de natureza diversa…
Um texto é sempre um tecido. E há uma única condição prévia que se exige ao leitor-observador: uma atitude hedonística, uma busca obsessiva de prazeres.

Sejamos explícitos:

1- Resumo-Expansão- O Resumo ou a Expansão têm a mesma natureza na sua essência mas, porque contrários os objectivos, apresentem resultados opostos.
Haverá sempre obrigatoriedade de decompor o texto em partes, mostrar como elas se articulam, qual a sua lógica sequencial e formal e partir depois para um desempenho de condensação ou de expansão. Fazemos notar que sempre se respeita a estrutura, a ordem, a lógica, e a substância textual.
Nem o resumo, nem a expansão se podem desviar dos conteúdos prévios insertos no texto do autor.
Este não é um exercício menor, mas é um tratamento iniciático à plenitude do acesso textual…

2- O Comentário - O comentário é libertário. Deixa que se olhe o texto segundo critérios indefiníveis e não reguláveis. Comenta-se o texto palpitando sobre gostos ou técnicas, sobre teorias ou sabores, sobre afectos ou aversões.
O comentário não tem vinculação teórica, é uma viagem ao sabor do deleite que pode ter passeios de indiferença ou acidentes de aversão.
O comentário não precisa de distinguir forma e conteúdo. É diletante.
O comentário pode viajar pelo texto no tempo da maré, como na majestade do mar encapelado. Comentar é o trato que se dá ao texto, muitas vezes com o nome de análise. Tal não é correcto porque não é verdade. O comentário é nocional, é emocional, é ideológico. A análise é técnica é rigorosa é científica,

3- A Análise – A análise dum texto é sempre conceptual; é por isso que ela é técnica, rigorosa e científica.
Não pode haver análise textual sem a prévia selecção do analisador.
Analisar um texto, particularmente um texto poético, nunca é uma prática absoluta e definitiva; é sempre inesgotável porque sempre depende do analisador a que sujeitamos o texto na leitura que dele possamos fazer.

Imaginemos quantas análises já fora feitas do soneto de Camões “ Alma minha gentil que te partiste”… ou mesmo do “ Manifesto Anti-Dantas” ou da Cena do ódio de Almada Negeiros, ou “ Cântico Negro” de José Régio, ou nas infinitas leituras de Bocage que sempre chegou aos analfabetos mais recuados. Pior, ou melhor será pensar na complexidade heteronímica da obra de Pessoa, onde tudo é “ pensado com o sentimento”...(ou será que tudo é “sentido com o pensamento”?).
O texto poético é tão enorme como o universo porque ele só pára depois do fim dos tempos.
Falando de texto, falamos de teia. E quem diz teia deve pressupor que da teia se faz tecido. Um texto em linguagem verbal pode ser analisado segundo várias coordenadas, Qualquer texto pode ser analisado do ponto de vista fonético, morfológico, sintáctico e semântico. Podem depois combinar-se e cruzar-se todas e quaisquer destas componentes para constituírem factor de análise.
Esta hipóteses de cruzamento de combinatórias analíticas conduzem-nos a uma multiplicidade de resultados imprevisíveis porque sempre intervêm na abordagem textual valores subjectivos que não são quantificáveis nem diferenciáveis…
Não podemos esquecer que o texto é, em si mesmo, um produtor autónomo de significâncias cuja dimensão, natureza e entorno é sempre variável de sujeito-leitor a sujeito-leitor. E, no mesmo sujeito-leitor, varia nas diversas circunstâncias, porque cada circunstância é sustentada por analogias, afinidades, discrepâncias, afectos , amores e ódios: e tudo interfere em tudo…
3.1 - O texto de explicitude é o texto mínimo, sumário na informação, esquelético na forma e sem adereços. É uma informação de rigor, precisa, unidireccional, informativa, não dialogística.
Mesmo o texto jurídico, que se quer unívoco, é fonte, ou causa, de inúmeros conflitos interpretativos.
Caso limite de texto que deve ser unívoco, para que se cumpra, com todo o rigor a vontade do de cujus, é o testamento. Pois mesmo neste caso temos os tribunais, com magistrados e advogados, a buscar cada um o entendimento da sua conveniência. E isto no acesso a um texto que, pela natural operacionalidade, deve ser de óbvia univocidade… Mesmo este texto se deixa penetrar de interpretações…
3.2 – O texto poético
A poesia é um estado mental.
A poesia faz-se poema tomando substâncias.
As substâncias com que se faz a forma do poema são três. E assim, conforme as substâncias, o poema se conforma, se transforma se abre ou se descobre…
Que o poema tem um corpo. Um corpo material, urdido e tecido na imprevista forma, composto nos fios da teia verbal que gera infinitudes de leituras racionais ou de inefáveis prazeres.
Sempre os sentidos se perturbam na aproximação ao texto poético. O leitor entra, procura entendimentos e, ora se arrepia de confusões, ora se deleita no devaneio inconsistente e inefável.
Nunca nos definimos de comportamentos perante o poema. O poema inebria, e enquanto inebria tanto provoca o desatinado chora como nos transporta para a irrealidade incontrolável dum cosmos que só pode desaguar numa madrugada de muitas primaveras.
Mas voltemos ao corpo do poema, porque é sempre no corpo que encontramos a expressão sensual. Entremos no corpo do poema como num templo. Deixemos também que o poema entre para dentro de nós. Ao contrário dos costumes....
O corpo do poema atrai, encanta, seduz…por ser melopeia porque é feito de músicas, de sonoridades, de ritmos, de batucagens que traçam o corpo vivo do poema. Então, o poema embala e entretém.
É o poema bom de dizer e o melhor para cantar.
O significante do poema é uma litania, um marulhar silábico, um cantarolar fonético…
Agora o corpo é já um jogo fánico, uma mescla holística de linguagens (des)organizada por símbolos que presidem ao excurso alegorético e donde fugiu todo o entendimento prosaico e literal. Nesta fanopeia estamos como na rosa dos ventos donde se abrem todos os nortes mas onde se perde o seguro dos sentidos.
Tudo é diverso e ocasional.
Tudo é circunstância e oportunidade.
É aqui que o poema produz e oferece todas as polessemias. É agora que o poema toca a definitiva e intangível intemporalidade.
Mas o poema veste-se de palavras. E as palavras têm marcas familiares, origens e estirpes, maternidades ou paternidades, famílias bem compostas ou analogias de muitas circunstâncias.
Há palavras elegantes e certeiras que viajaram de iate até ao destino e outras, muitas, palavras marinheiras e travessas, colhidas na acostagem dum porto ocasional perdido nos mistérios de todas as Áfricas…
Todavia, todas as palavras carregam sentidos prévios, e nas muitas significâncias nos enredamos, e nesta logopeia nos encobrimos e nos descobrimos no corpo do poema.

Mas procuremos os poemas. Procuraremos os poemas!
Por mim, quero ficar refém do poema…
JCR

1 comentário:

cleiton disse...

GOSTEI DO SEU TEXTO, MAS ELE AINDA NÃO É O QUE EU ESTAVA PROCURANDO, POIS ESTOU PRECISANDO SABER MAIS SOBRE ANALISE DE TEXTO POETICO, SE VOCÊ TIVER ALGUMA LEITURA QUE POSSA ME AJUDAR,ENVIE POR FAVOR PARA O MEU E-MAIL..

csdasilv@hotmail.com